Consuelo de Castro
(1946–2016) foi a caçula da chamada “Geração 1969” que revelou ao final da
década de 1960, além de seu nome, aqueles de Antônio Bivar (1939-2020), José
Vicente (1945-2007), Isabel Câmara (1940-2006) e Leilah Assumpção (1943-).
Consuelo tinha apenas 22 anos quando escreveu Prova de Fogo sua peça de
estreia que já foi taxada como PROIBIDA pela famigerada censura da época.
Rebelde, feminista e contestadora sua obra é marcada por essas características.
Muitos textos de Consuelo ainda permanecem inéditos e é sempre surpreendente
quando alguns deles vêm à tona como foi o caso de Uma Lei Chamada Mulher
em 2020 e agora de Medeia, uma releitura do original Medeia: Memórias
do Mar Aberto de 1997.
A Medeia de
Consuelo de Castro baseia-se no mito grego e na tragédia de Eurípedes, escapa
porém de certas soluções, para dar ênfase na força da protagonista exaltando seus
valores feministas e oferecendo desfecho bastante diverso do original.
A excepcional
fotografia em preto e branco de Gabriel Fernandes é responsável pelo impacto
visual das primeiras cenas e já mergulha o espectador no clima sufocante do
espetáculo. Acertadamente batizado pela Cia.Br116 como teatrofilme, o
espetáculo é um exemplo do diálogo entre as duas artes. Os closes e os planos
utilizados nos vários diálogos são obra de mestre, remetendo às obras primas de
Ingmar Bergman da década de 1950 fotografadas magistralmente em preto e branco
por Sven Nykvist e Gunnar Fischer.
A cenografia rústica
elaborada por Cássio Brasil colabora para a dureza do espetáculo com momentos
memoráveis como aquele em que Medeia retira de uma montanha de carvão o vestido
dourado que será envenenado e servido como presente para a futura esposa de
Jasão. As cenas externas também são dotadas de rara beleza, apesar de sua
aridez.
A trilha sonora de
Felipe Antunes e Fábio Sá composta não só de música envolvente, como de sons da
natureza e de objetos se atritando dão um toque especial à proposta da
encenação. É muito oportuna a canção final interpretada por Tulipa Ruiz.
Bete Coelho assina
com Gabriel Fernandes a vigorosa direção do espetáculo.
Um elenco excepcional
dá o toque final a este trabalho: Luiza Curvo representa a noiva Glauce em sua
insegurança frente à poderosa rival; Matheus Campos, com seu belo porte
físico, desempenha Apsirto o irmão assassinado
pela própria Medeia; Flavio Rochaa mostra a dignidade de um Jasão bem mais
ponderado do que aquele da tragédia de Eurípedes; Roberto Audio tem estofo para
criar o poderoso Creonte (a única coisa que destoa e soa artificial é a sua
longa barbicha); em um grande momento dramático Michele Matalon representa com
muita dignidade e muita força a Ama que aconselha Medeia e, finalmente, Bete
Coelho tem sua maior interpretação dramática, superando até o excepcional
trabalho realizado em Mãe Coragem.
O espetáculo, na forma em que foi concebido, tem potência para agradar em cheio tanto o amante de teatro como o cinéfilo.
A temporada de MEDEIA
vai até 12 de março de quarta a sábado às 20h e aos domingos às 18h. Acesso
fácil e gratuito pelo Canal da BR116 no YouTube.
ABSOLUTAMENTE IMPERDÍVEL
08/02/2021