domingo, 9 de fevereiro de 2014

ADORMECIDOS - EM BUSCA DA DELICADEZA PERDIDA


 
     O título O País da Delicadeza Perdida de um DVD de Chico Buarque se aplica perfeitamente a este Brasil de 2014 repleto de notícias sobre intolerância, preconceitos (racial, sexual e de classe), violência gratuita, políticos corruptos, governantes perdidos e uma falsa aura de felicidade que só acredita quem não quer ver ou se contenta com uma miserável bolsa família. É nesse cenário, quase num pedido de socorro, que alguns artistas vão em busca dessa delicadeza perdida e não creio que seja obra do acaso o fato de eu ter assistido em dias seguidos a dois espetáculos que remetem a essa procura: Ou Você Poderia Me Beijar (já comentado neste blog) dirigido por Zé Henrique de Paula e este Adormecidos, em cartaz no Espaço dos Satyros 1 e dirigido por Rodolfo García Vázquez. Por caminhos diferentes ambas as encenações nos fazem acreditar que a delicadeza ainda é possível.
     Adormecidos é um texto do dramaturgo norueguês Jon Fosse sobre dois casais que habitam certo espaço em diferentes tempos. Nada se explicita, tudo é sugerido, não se conhece nem o nome nem as características das personagens. Elas estão ali sujeitas à ação do tempo que é mais cruel para um dos casais devido à doença da mulher. Na verdade um casal envelhece e o outro não. Parece estranho, mas não é. Esta delicada direção de García Vázquez é bastante diferente de outros trabalhos do encenador em geral caracterizados por textos sobre violência urbana com limitado acabamento visual e com cenas de sexo e nudismo.  Um criativo jogo de espelhos torna a encenação visualmente muito bonita e as personagens deslocam-se suavemente pela cena parecendo flutuar naquele tempo e espaço tão etéreos quanto eles. Em certos momentos o público também passa a fazer parte daquele espaço passando de observador a observado.
 
     Luiza Gottschalk e José Sampaio interpretam o casal que envelhece e têm um melhor rendimento nas cenas da velhice. Luiza tem um belíssimo rosto que remete à grande atriz Ingrid Bergman.
     O outro casal tem a possibilidade de realizar um trabalho mais envolvente uma vez que há conflito no seu relacionamento o que não ocorre com o primeiro casal. Tiago Leal e Katia Calsavara interpretam esse casal com muita naturalidade e talento.
 
     A quinta participação é de um ator que faz um amante, um filho e também é responsável pela sonoplastia do espetáculo. Nesta apresentação o ator Fábio Ock foi substituído por outro ator de quem a produção não teve o cuidado de indicar o nome.
     Não fica claro na ficha técnica, mas segundo informação da atriz Luiza Gottschalk a bela trilha sonora que permeia todo o espetáculo é, em sua maioria de autoria de Fábio Ock.
     Adormecidos estreou em 2013 sem a repercussão merecida e nesta nova temporada (até 26 de abril) merece uma visita daqueles que curtem um espetáculo sensível.
Fachada do Espaço dos Satyros na Praça Roosevelt
 
     Em cartaz aos sábados e domingos às 19h no Espaço dos Satyros 1.

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