Trata-se
de um torneio? De um exame vestibular? De um concurso de resistências física e
emocional? Seja o que for o jogo é massacrante e cruel.
O espetáculo de Felipe Hirsch baseia-se no
livro Facsímil do escritor chileno
Alejandro Zambra (1975) onde ele cria relatos poéticos e exercícios de
linguagem a partir da estrutura da Prueba
de Aptitud Verbal (tipo teste de conhecimentos de múltipla escolha) que foi
aplicada aos candidatos às universidades chilenas de 1967 a 2002. Nada mais
antidramático, no entanto, do uso desse arcabouço e de memórias pessoais de cada
ator, o grupo criou a criativa e poderosa dramaturgia que segura o espectador
na poltrona durante a hora e meia de duração da montagem.
Cinco
pessoas enfrentam esse jogo extremamente competitivo se submetendo a um
inquisidor/ditador (voz em off) que
coloca as perguntas, ouve as respostas e considera certa aquela que mais lhe
convém, dizendo um lacônico “Erro” quando alguém tropeça na resposta e cortando
drasticamente a palavra daquele que está dando seu relato pessoal. Nada mais
metafórico do que se viveu no Chile durante a ditadura de Pinochet como também
das sequelas deixadas nos jovens após o término daquele regime autoritário e a
volta da democracia. Comparações com a situação brasileira são inevitáveis.
Trata-se
de uma das mais certeiras direções de Felipe Hirsch que coloca o elenco numa
movimentação cênica de tirar o fôlego. Colaboram para isso o imenso painel
iluminado com a palavra democracia em letras garrafais (direção de arte de
Daniela Thomas e Felipe Tassara, parceiros de Hirsch em várias produções) e a
iluminação sempre competente de Beto Bruel.
O
ótimo e resistente elenco é todo chileno com destaque para a grande atriz
Trinidad González que já havíamos tido o privilégio de ver como Olga Knipper em
Neva (2009) e como Rainha Isabel em
empolgante diálogo com Cristovão Colombo em A
Reunião (Mirada, 2014) e que aqui nos brinda com um relato sobre seu
casamento, a separação e o fato do divórcio não ser legal no Chile naquela
ocasião.
Trinidad González em cena de "A Reunião"
Democracia é uma coprodução do Brasil e
do Chile e trata-se desde já de um dos mais significativos espetáculos do eixo Mostra de Espetáculos da MITsp 2019.
20/03/2019
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