Fazendo uma rápida
visita ao Google constatei que existem 55 filmes com personagens paraplégicos
ou tetraplégicos, alguns deles tocando no assunto polêmico da eutanásia, sendo Mar
Adentro (2004) com Javier Barden talvez o mais famoso entre eles.
Dois bons exemplos de
montagens teatrais sobre o assunto são Feliz Ano Velho baseado no livro
de Marcelo Rubens Paiva e A Valsa de Lili na interpretação memorável de
Débora Duboc. Um exemplo clássico e muito bem resolvido cenicamente é uma das
cenas de Os Sete Afluentes do Rio Ota dirigida por Monique
Gardenberg, onde o personagem em estado terminal por conta da Aids, realiza
suicídio assistido, resultando em um dos momentos mais comoventes já vistos em palco
paulistano, sem esquecer também de Cuando Pases Sobre Mi Tumba do
uruguaio Sergio Blanco onde o assunto é tratado de forma bastante interessante.
Amadeo seria apenas outra
obra tratando do assunto, não fosse a maneira original como é tratado e como a
ótima estrutura narrativa criada pelo jovem dramaturgo francês Côme de
Bellescize (1980-) envolve o público de maneira equilibrada entre a densidade
do drama apresentado e a maneira poética e até bem humorada como o assunto é
tratado.
Após uma rápida cena
inicial onde Amadeo diverte-se entre correr com seu carro veloz e tentar
convencer a namorada Julia a transar com ele, o rapaz sofre o acidente onde
fica tetraplégico e a partir daí são cenas tensas nos hospitais, cenas na
tentativa das pessoas se comunicarem com ele até a dramática parte final onde
ele pede insistentemente para que deem um fim à sua vida. Em interessante
recurso dramatúrgico o autor introduz o personagem de Clóvis, talvez uma
imaginação do Amadeo imóvel ou seu alter ego e essa figura provoca o rapaz para
que ele reaja e procure recuperar os movimentos, fazendo isso de maneira
bastante dinâmica e dando toques de humor à tragédia apresentada. Com esse
recurso a personagem de Amadeo pode se movimentar nessas cenas oníricas,
evitando assim a total imobilidade do ator até o fim da peça.
Com quase um “não
cenário” circular de Marisa Bentivegna, belamente iluminado por Wagner Freire e
adornado no chão com a incrível direção de imagem e videoclipping de André
Grynwak e Pri Argoud, Nelson Baskerville realiza uma encenação potente sobre
assunto muito delicado e urgente. Contribuem muitíssimo para o clima da
montagem a belíssima trilha sonora de Marcelo Pellegrini e os figurinos de
Marichilene Artisevskis.
Se a apresentação não
fosse se alongar demais, seria muito interessante que na cena em que os
personagens estão em programa de televisão discutindo os prós e os contras da
eutanásia, a discussão se abrisse para a plateia para ouvir a opinião de meia
dúzia de pessoas.
Tudo isso seria pouco
sem um elenco superlativo: o jovem Thalles Cabral desincumbe-se do personagem
título com muita dignidade tanto quando está em movimento como quando está
imóvel; Thomas Huszar compõe muito bem o personagem do amigo de Amadeo e os
personagens mais velhos para os quais não tem físico apropriado; apesar de
gritar um pouco demais em várias cenas César Mello se sai bem como o chefe
dos bombeiros.
No meu modo de ver o
grande trunfo do espetáculo está nas intérpretes femininas: a Julia de Janaína
Suaudeau brilha na sua graça e juventude; Cláudia Missura empresta suas técnicas
de clown para criar Clóvis, o alter ego de Amadeo e Chris Couto, em mais um
momento de sua brilhante carreira, interpreta a mãe com toda a intensidade
exigida pela personagem.
Amadeo não é um
espetáculo fácil, chega até a ser incômodo em alguns momentos, mas a vida não é
formada só de flores e é muito importante que assuntos desagradáveis também
sejam tratados e discutidos pelo teatro.
AMADEO termina sua
temporada no Tucarena no próximo domingo, dia 28, com sessões sexta e sábado às
20h30 e domingo às 18h,
ÚLTIMAS CHANCES. NÃO
PERCA!
21/05/2023
é maravilhoso! gostei demais do trabalho corporal do elenco que leva a catarse. beijos, pedrita
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