A paulista Victória Bonaiutti de Martino adotou o nome de Marlene quando iniciou sua carreira de cantora na década de 1940. É sempre lembrada como a artista popular do auditório da rádio Nacional do Rio de Janeiro e que era rival de Emilinha Borba com quem todos os anos disputava o título de Rainha do Rádio. O auge desse sucesso foi a década de 1950 e com o advento da bossa nova e da televisão a cantora viu sua carreira eclipsada nos anos 1960.
Como fênix renascida das cinzas, na década de 1970, Marlene ressurge poderosa agora também como ótima atriz teatral. Em 1973, beirando os 50 anos interpreta a viúva dona do bar na peça Botequim de Gianfrancesco Guarnieri. Na ocasião Sábato Magaldi criticou negativamente a peça, mas ressaltou: “É com prazer que se encontra a garra de Marlene, dando uma grande força interpretativa às canções”. Em 1980 ele substitui Maria Alice Vergueiro na versão paulista de A Ópera do Malandro de Chico Buarque de Holanda.
Quero comentar aqui sobre um show ao qual infelizmente não assisti que estreou no Rio de Janeiro em 1974 e que foi apresentado no ano seguinte em São Paulo primeiro no Teatro Oficina e depois no Tuca. Trata-se de Te Pego Pela Palavra, idealizado e dirigido por Herminio Bello de Carvalho. Tomei conhecimento do mesmo por meio do LP que foi lançado na época e que, apesar de ser editado, consegue transmitir a energia do espetáculo. Marlene assume a indignação com os tempos sombrios que o Brasil vivia na época da ditadura e com muito vigor interpreta as canções de revolta de Taiguara, João Bosco/Aldir Blanc e Gonzaguinha. Era tanta a energia despendida pela artista durante o espetáculo que Gonzaguinha comentou: “Qualquer dia, acabado o espetáculo, a cantora sumiu. Foi encontrada apenas uma mancha de suor”. Além disso, Marlene dosa com muito humor o sombrio dessas músicas com interpretações memoráveis de canções de Moreira da Silva e de Manezinho Araújo.
A experiência de ouvir esse disco (já existe uma versão em CD do mesmo) é inigualável. Aos 51 anos Marlene estava em plena forma e nos faz rir, chorar e refletir sobre aquela época de triste memória.
Hoje, dia 14 de junho de 2014, ao comprar o jornal tive notícia da morte de Marlene quase aos 90 anos (completaria em novembro). Ao chegar em casa coloquei o disco para ouvir e mais uma vez me emocionei quando ao final ela canta Roupa Prateada do também saudoso Zé Rodrix:
O que eu preciso dizer a vocês/Vai acabar ficando só entre nós/Vocês só vão entender quando chegar em casa/Muito tempo depois/E vocês vão voltar/E vão escutar outra vez/Mas por enquanto eu só quero por a roupa prateada/E cantar pra vocês.
Muita gente não entendeu até hoje, Marlene. Não faz mal, ponha a roupa prateada e continue a arrebatar com sua garra... Seja lá onde for!
Ai, quero ouvir o disco. Ou você me convida para ouvir na sua casa ou grava para mim. Você decide.
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