quinta-feira, 10 de novembro de 2016

TIROS EM OSASCO


        Pois é! Chico Buarque uma vez cantou que “o tempo passou na janela, só Carolina não viu”. Para os carolinos de Cássio Pires o mundo passa e eles sequer dirigem-se à janela para olhar o que acontece lá fora. São jovens alienados movidos a sexo, bebida e rock and roll, voltados para o próprio umbigo. O primeiro casal ainda tenta discutir e entender o que ocorreu na chacina ocorrida em Osasco em 13 de agosto de 2015, mas nas demais cenas o máximo que se ouve sobre o fato é a pergunta “Essa história que aconteceu em Osasco, o que você acha?”. Ninguém responde ou dá continuidade ao assunto. Tiros parecem atingir os carolinos durante suas discussões, mas eles se recompõem logo a seguir, como se nada tivesse acontecido. Um personagem vai a um bar no local da chacina e mostra-se interessado em saber o que aconteceu, mas acaba apenas dando vazão a suas angustias pessoais.


        O texto de Cássio Pires é engenhoso e difícil de ser resumido. Formada de cenas isoladas a peça tem como pano de fundo a violência urbana, no caso, ilustrada com a já citada chacina de Osasco que é mais uma entre tantas outras que acontecem em uma cidade como São Paulo.
        O espaço cênico do mezanino da Fiesp é um longo corredor e André Cortez soube ocupá-lo de maneira bastante criativa com cenas ocorrendo em vários planos. Yara de Novaes realiza nesse espaço uma provocativa direção auxiliada pela trilha sonora de Dr. Morris e pela atuação do jovem e vigoroso elenco.


        O ano teatral paulistano de 2016 vai ficar marcado pelo surgimento de vários grupos de jovens egressos de escolas de teatro que realizaram trabalhos sérios e altamente profissionais. Desta vez são aqueles advindos do Núcleo Experimental de Artes Cênicas do Sesi-SP que provocam impacto com seu despojamento, talento e coragem ao interpretar personagens complexos e com pouco desenvolvimento em função da curta duração das cenas. As necessárias cenas de sexo e nudez são realizadas com muita naturalidade e bom gosto. Ao ver trabalho tão sério com grupo tão jovem, penso feliz: “Nosso teatro tem futuro!!


        Assisti ao espetáculo no último dia e nessa apresentação uma senhora, parente de um dos executados, não conteve fortes soluços ao final da peça, o que provocou comoção generalizada do elenco, do autor, da diretora, da produtora e de todo o público presente. A realidade, muitas vezes, supera a ficção.
        Tiros em Osasco ficará para sempre como uma forte experiência da minha longa vida de espectador.
        Infelizmente a peça saiu de cartaz no último domingo, mas a nossa torcida é que ela volte ao cartaz e que os jovens deste Brasil que elegeram Dórias e Crivellas corram para assistir.


10/11/2016

Nenhum comentário:

Postar um comentário