Eu
vou virar petróleo?
Ainda
é cedo para concluir, mas dá para conjecturar que Fóssil estará na lista dos melhores espetáculos apresentados em São
Paulo em 2020.
O
impacto visual já acontece quando se adentra o espaço cênico. De um lado um
executivo com ar taciturno está sentado em sua mesa de trabalho tendo ao fundo
paisagem sombria de um complexo industrial com chaminés soltando fumaça, do
outro uma jovem sorridente caminha por paisagem solar que lembra um oásis. As
paisagens e os ânimos dessas duas personagens vão se chocar quando a jovem
(Anninha) procura o executivo (Luís) buscando a aprovação de projeto para a
realização de filme sobre guerrilheiras curdas. Anninha e Luís já se conheciam,
uma vez que ele foi amigo/chefe/amante de sua mãe. A partir daí ela tenta
convencê-lo do seu projeto e para tanto lhe/nos dá verdadeira aula da geografia
do Oriente Médio e do local onde existiu o Curdistão, além de comentar sobre as
atividades do povo curdo; tudo isso de maneira lúdica e prazerosa sem o menor
ranço didático.
O
texto bem articulado de Marina Corazza foi feito a partir de extensa pesquisa
realizada pela atriz Natalia Gonsales sobre a Revolução de Rojava onde as
mulheres curdas têm uma participação definitiva. A peça ainda faz um paralelo
com a atuação das mulheres brasileiras na resistência à ditadura militar. Uma
referência ao dilúvio bíblico onde toda a humanidade foi parar no fundo do mar contada
pela avó de Anninha justifica o título da peça e a pergunta que a neta faz para
a avó em determinada cena. Como se vê o texto de Marina abre várias frentes
interessantes, sem, entretanto, perder o foco que é a luta dos curdos pelo
direito de ter um país e, principalmente, o papel da mulher curda nessa luta.
As
projeções dos vídeos concebidos por André Grynwask e Pri Argoud são um dos principais
atrativos da peça, ilustrando, comentando e embelezando cada momento de toda a
encenação. O cenário de Carol Bucek iluminado por Aline Santini e a
significativa trilha sonora de Marcelo Pellegrini baseada em motivos orientais
são os outros recursos bem orquestrados por Sandra Corveloni na direção, dando
como resultado um espetáculo orgânico e muito belo. Poucas vezes temos visto
forma e conteúdo tão em harmonia como nesta montagem.
Natalia
Gonsales tem uma das melhores interpretações de sua já significativa carreira
mesclando a doçura e a firmeza da personagem com muita categoria e é muito bem
acompanhada por Nelson Baskerville como o executivo bem colocado na vida que
não entende porque a “doce” Anninha trocou a inofensiva carreira como dançarina
por um trabalho militante e perigoso.
Termino esta matéria com a sensação que ela é muito pequena para abrigar toda a grandeza desse espetáculo idealizado por Natalia Gonsales.
Termino esta matéria com a sensação que ela é muito pequena para abrigar toda a grandeza desse espetáculo idealizado por Natalia Gonsales.
FÓSSIL
está em cartaz no SESC Pompeia de quinta a sábado às 21h30 e domingos e feriados
às 18h30, só até 02/02. ABSOLUTAMENTE IMPERDÍVEL.
Fotos de Ronaldo Gutierrez
22/01/2020
Cetra, querido:
ResponderExcluirConcordo com vc sobre Fóssil ser já um dos "melhores espetáculos apresentados em São Paulo em 2020".
Sensível e ao mesmo tempo contundente registro da luta das mulheres curdas pela democracia.
Bjs
Maurício