Nos anos 1960/1970 de triste memória, se por um lado a
ditadura proibia o acesso a qualquer obra que contivesse a menor menção contrária
a ela, por outro lado as chamadas patrulhas ideológicas ligadas aos opositores
do governo também procuravam cercear o acesso àquelas obras rotuladas de
alienadas e pequeno burguesas. Assim, para qualquer militante que se prezasse
era “proibido” gostar de A Noviça Rebelde
ou de uma música que só falasse de amor e flor. Estamos em 2014, e os ares hoje
são outros, mas mesmo assim nos deparamos com reações preconceituosas quanto
externamos que gostamos de um musical ou de uma comédia inteligente. Pois bem,
patrulheiros de plantão, informo-lhes que adorei Vidas Privadas, em cartaz desde sábado (10/05) no Teatro Jaraguá!
Vidas Privadas é
uma comédia, dita de boulevard,
escrita em 1930 pelo dramaturgo inglês Noël Coward (1899-1973) e que tem sua origem nos vaudevilles franceses. A novidade está
no modo como o autor trabalha o tema central que trata das dificuldades e das hipocrisias
inerentes às relações conjugais. De certo modo, o segundo ato da peça é um
precursor das lavagens de roupa de suja de casais que se tornaram constantes no
teatro após o advento de Quem Tem Medo de Virginia Woolf de Edward Albee.
Noël Coward
A elegante e divertida peça de Coward encontra sua
correspondência na deliciosa montagem de José Possi Neto com tons fortemente
cinematográficos dos anos 1930 desde a abertura com os letreiros apresentando a
ficha técnica do espetáculo, passando pela trilha sonora de Tunica (que já
havia feito a trilha da montagem de 1986, dirigida por Emílio Di Biasi) e Aline
Meyer, pelas entradas e saídas precisas do elenco no primeiro ato, pela
divertida troca de cenário do primeiro para o segundo ato feita em ritmo de
cinema mudo por dois divertidos contra regras e, finalmente,pelo estilo art déco tanto no mobiliário como nos
figurinos.
Para realizar um espetáculo desse tipo é necessário um
elenco bonito, carismático e, é claro, talentoso e o diretor foi muito feliz na
escolha do mesmo. Lavínia Pannunzio (sempre poderosa em cena e com ótimo tempo
de comédia) e José Roberto Jardim (caindo de charme em seu novo look sem barba e com os cabelos mais
curtos e “abrilhantinados”) formam o belo par central. Chiques, sofisticados e
muito irônicos ambos esbanjam talento e dão um show em cena. Os momentos mais divertidos são divididos com Daniel
Alvim e Maria Helena Chira que se saem muito bem principalmente na última parte
da peça.
A encenação de Possi Neto conta com uma ótima
equipe de apoio graças à eficiente produção de João Federici: nos cenários
(Marco Lima), nos figurinos (Fábio Namatane), na iluminação (Wagner Freire),
nas já citadas responsáveis pela trilha sonora e na maquiagem dos atores (caracterização
por Westerley Dornellas). Esses elementos conjugados e harmonizados pelo
encenador resultam num todo competente e profissional.
Vidas Privadas é um
espetáculo comercial que difere bastante das comédias grosseiras que grassam
pela cidade e que merece ser prestigiado por um público que busca entretenimento
inteligente e divertido. Em cartaz no Teatro Jaraguá às sextas às 21h30, aos
sábados às 21h e aos domingos às 19h.
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