Beckett
já colocou sua personagem Winnie enterrada até o pescoço em Dias Felizes e radicalizou ainda mais ao
colocar apenas os lábios de uma atriz em cena, tudo isso para falar sobre o
absurdo que é viver.
Lili
está presa e imóvel em uma cama de hospital por toda sua vida, mas neste caso trata-se
de situação real, “absurdamente” real! Atacada pela poliomielite quando criança,
Eliana Zagui ficou tetraplégica e foi praticamente abandonada pela família.
Vivendo em um hospital, ela foi aprendendo a viver dentro de suas limitações
tornando-se escritora, pintora e mais que isso, um exemplo de superação diante
de tanto sofrimento.
O
livro Pulmão de Aço escrito por
Eliana serviu de base para A Valsa de
Lili, peça teatral escrita por Aimar Labaki e interpretada com grande
paixão por Débora Duboc sob a direção de Débora Dubois.
Débora
Duboc está em cena com roupas brancas em um leito hospitalar coberto de lençóis
também muito alvos (cenografia e “figurino objeto” de Márcio Vinicius). Só tem
a cabeça para se comunicar e quando o público adentra o espaço ela se mostra
muito feliz e descontraída sorrindo e cantando músicas da Rita Lee.
O
relato de Lili falando de sua infância, do cotidiano no hospital, de momentos
alegres como a visita de Fabio Júnior, de outros muito tristes como o abandono
da família e a morte de companheiros vizinhos de cama e ainda revelando indignação
ao dizer que até para morrer depende de terceiros é muito comovente e Débora
Duboc é no mínimo surpreendente na interpretação dessa figura extraordinária.
A
interpretação de Débora Duboc vem somar-se a outros não menos excelentes
trabalhos femininos neste conturbado 2019 (Cássia Kiss, Esther Laccava, Juçara
Marçal. Lara Córdulla, Tânia Bondezan, Analu Prestes, Virginia Buckowski,
Juliana Sanches, Alejandra Sampaio, Helena Ignez, Yara de Novaes, entre tantas
outras). O poder feminino é símbolo de resistência no teatro e o maior exemplo
disso é a figura da grande Fernanda Montenegro do alto dos seus 90 anos de vida
digna e laboriosa.
A
delicada direção de Débora Dubois está focada na interpretação de sua xará com
o auxílio da cenografia e “figurino objeto” de Márcio Vinicius, tudo isso sob a
iluminação sempre competentíssima de Aline Santini. Apesar do tema, em momento
nenhum o espetáculo resvala para a emoção fácil, porém não há um espectador que
não saia da sala enxugando as lágrimas e acenando para aquela figura imóvel que
se despede dele com um sorriso nos lábios.
Devemos
essa grande demonstração de sensibilidade, humanidade e exemplo de vida a
Eliana Zagui, Aimar Labaki, Débora Dubois e, é claro, a Débora Duboc em momento
extraordinário de sua carreira de grande atriz. Que venham os prêmios, porque a
interpretação para recebê-los já existe.
Termino
esta matéria com o dizer de Eliana Zagui: apesar do corpo imóvel, “minha alma
nunca deixou de dançar”.
A
VALSA DE LILI está em cartaz no Giostri Livraria e Teatro (antigo TOP Teatro,
ao lado do Teatro Sérgio Cardoso) às quintas e sextas às 21h até 13/12.
ABSOLUTAMENTE IMPERDÍVEL.
09/11/2019
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