Em
menos de quinze dias perdemos cinco pessoas importantíssimas para o nosso
teatro: Michel Fernandes puxou a fila no dia 17 de maio e foi levando com ele o
Kiko Jaess, o Carlos Colabone, o Iacov Hillel e hoje a nossa queridíssima Maria
Alice Vergueiro.
Quem
de nós vai sobrar para contar a triste história do tempo presente?
Lembro-me
de Maria Alice, sempre transgressora, no início dos anos 1970, na anarquia do Gracias Señor do Zé Celso, depois vieram
O Lírio do Inferno e O Belo Indiferente, ambos ou pelo menos
um deles no aconchegante Espaço Off
que o Celsinho Cury tinha ali numa travessa da Avenida Nove de Julho. Com o Ornitorrinco nos anos 1980/1990 ela fez coisas maravilhosas junto com o Cacá
Rosset e a Christiane Tricerri e chegou a ser uma vigorosa Mãe Coragem (2002) pelas mãos do Sérgio Ferrara.
Apesar
de toda exuberância e energia que ela mostrava tanto no palco como na vida real,
a interpretação de Maria Alice que mais me impactou foi em Katastrophé dirigida pelo Rubens Rusche em 1986 que constava de
quatro peças curtas de Samuel Beckett. É impossível não se lembrar da peça Eu Não que iluminava apenas sua boca e sua
voz poderosa discorria sobre a vida, entre silêncios, que às vezes eram mais
eloquentes do que as próprias palavras. Em Cadeira
de Balanço ela voltava a brilhar, interpretando uma mulher sentada numa
cadeira fazendo movimento contínuo de balanço, enquanto se ouve sua voz
gravada, aos poucos ela começa a emitir sons até suas palavras se juntarem
àquelas emitidas pela voz gravada. Momentos sublimes e inesquecíveis da grande
atriz que fazem dessa montagem uma das mais significativas de minha vida de
espectador.
A
presença de Maria Alice foi rareando nos palcos neste início de século, mas ela
voltou a brilhar em As Três Velhas
(2010), junto com Pascoal da Conceição e seu grande companheiro Luciano
Chirolli e, principalmente, em sua despedida triunfal já bastante debilitada em
Why the Horse, onde era simulado o
seu velório.
Maria
Alice tinha o sonho de morrer no palco. Quase que conseguiu.
A
estrela dessa vigorosa mulher é muito forte e com certeza não se apaga com a
sua partida destas bandas.
VAI
EM PAZ, MARIA ALICE!
03/06/2020
Saiu de cena neste momento crítico da peça inenarrável da vida.
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