terça-feira, 5 de maio de 2015

OE


 
        Ontem no metrô ao voltar do teatro eu tentava sintetizar numa palavra a peça que acabara de assistir e aquela que me veio à mente foi FILIGRANA. Repeti a palavra inúmeras vezes tendo sempre à minha frente a imagem de Eduardo Okamoto no espetáculo. Chegando em casa, minha primeira ação foi recorrer ao dicionário para ver o significado e o Aurélio me mostrou o seguinte: Filigrana: obra de ourivesaria formada de fios de ouro ou de prata delicadamente entrelaçados e soldados.
        BINGO! Os fios de ouro em questão são a poética e concisa dramaturgia de Cássio Pires inspirada na obra do escritor japonês Kenzaburo Oe, a belíssima iluminação de Márcio Aurélio e a interpretação minimalista de Eduardo Okamoto que uma vez entrelaçados e “soldados” pelo encenador/ourives Marcio Aurélio formam a preciosa filigrana OE oferecida ao público.
 
Foto de Fernando Stankuns
 
        Eduardo Okamoto tem raro domínio do espaço cênico e dos poucos objetos de cena que manipula durante o espetáculo (uma faca, um pequeno banco e alguns panôs). Mínimos gestos como um abrir de mão para definir um rio (auxiliado pela delicada iluminação) ou um estalar de dedos mesclam-se com gestos mais largos criando um todo harmonioso com forte influência do butoh. Outro componente importante da atuação do ator é sua perfeita dicção (não se perde uma sílaba do que ele fala) e a versatilidade da voz criando tons bastante distintos para o pai e para o filho deficiente. Numa temporada de excelentes interpretações solos (vide Gustavo Gasparani em Ricardo III e Eduardo Mossri em Cartas Libanesas), some-se este brilhante trabalho de Okamoto.
        Digno trabalho de ourivesaria é o texto de Cássio Pires. Partindo de um volumoso romance (Jovens de Um Novo Tempo, Despertai) o dramaturgo criou este monólogo misto de narração e interpretação onde o pai tenta definir o mundo para seu filho deficiente em 28 mini cenas. O resultado é poético e emocionante, sem nunca cair no melodramático.
        Por último, mas não menos importante, o entrelaçador Marcio Aurélio que com sua sensibilidade de iluminador e encenador junta os outros fios soldando-os e lhes dando unidade.
 
Foto de Fernando Stankuns

        Após o espetáculo Okamoto comentou comigo que iniciou o trabalho pensando em seu pai, mas durante o processo de criação soube que ia ser papai e isso de alguma maneira alterou a sua visão do trabalho. Caetano, um lindo garotinho de oito meses, filho dele com a querida produtora Daniele Sampaio estava presente na estreia  para prestigiar o sucesso do pai.

        Momentos de rara poesia aguardam por aqueles que pretendem assistir a este imperdível espetáculo.

        OE está em cartaz no Espaço Beta do Sesc Consolação de 04 de maio a 03 de junho às segundas, terças e quartas sempre às 20h.

05-05-2015

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