“Fale de sua aldeia e estará falando do mundo”.
A frase de Tolstoi se encaixa como uma luva no espetáculo Jacy do grupo potiguar Carmin. A primeira boa surpresa está em estarmos
assistindo a espetáculo criado fora do eixo Rio-São Paulo e a segunda, melhor
ainda, é que se trata de excelente e criativa montagem.
Uma
frasqueira encontrada ao acaso na rua pelo ator/dramaturgo/diretor Henrique
Fontes é o início de tudo. A abertura revelou objetos, cartas e documentos
pertencentes a Jacy. Um homem? Uma mulher? De posse do cartão de um taxista o
grupo iniciou processo de investigação detetivesca até chegar em Sara,
cuidadora de uma senhora de nome Jacy que morreu aos 90 anos em Natal e o resto
é história!
A
montagem mostra o processo de investigação, assim como, a vida dessa senhora
nascida em 1920 que teve vida nada espetacular a não ser ter vivido em épocas
conturbadas como a segunda guerra mundial e a ditadura militar e também ter se
apaixonado e casado por capitão americano.
São
dois atores em cena: Quitéria Kelly e Henrique Fontes, auxiliados por Pedro Fiúza
que opera som e luz, além de manipular imagens e adereços que são projetados em
tela ao fundo do palco. Os recursos são extremamente simples, mas os resultados
são muito criativos e significativos. O texto escrito por Pablo Capristano e
Iracema Macedo sofreu tratamento dramatúrgico por Henrique Fontes e Pablo
Capistrano. A direção de Henrique Fontes é sóbria focando toda a atenção no
trabalho dos atores. Quitéria Kelly, além da bela presença, apresenta com
versatilidade tanto cenas narradas como interpretativas, o mesmo podendo se
dizer de Henrique Fontes. Os desenhos que o ator faz mostrando Jacy se curvando
com a idade é um dos momentos mais belos a que já presenciei no teatro (vide
foto acima).
As
citações da situação política potiguar, assim como, de fatos acontecidos no
passado revelam uma universalidade que faz jus à frase de Tolstoi citada no
início desta matéria. Em vários momentos do espetáculo, os atores comentam
ironicamente algo parecido com “Mas agora as coisas mudaram...”. Pois é!!
Henrique Fontes, Quitéria Kelly e Pedro Fiùza
Jacy faz pensar e também comove pela
simplicidade com que foi concebido ao contar história trivial que podia ter
ocorrido com qualquer um de nós. Excelente exemplo de teatro documental (gênero
que corre o risco de resultar monótono e tedioso) que precisa ser visto.
O
Grupo Carmin completa dez anos neste janeiro e tem respeitável currículo como é
mostrado no programa da peça. Espera-se que São Paulo tenha a oportunidade de
assistir a outros trabalhos do grupo.
JACY
está em cartaz no Sesc Pinheiros de quinta a sábado às 20h30 até 18 de
fevereiro. IMPERDÍVEL!
20-01-2017
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