O grito de independência
de uma atriz
Dona
de belos e imensos olhos verdes, Ester Laccava parece ter soltado todas as
amarras para se lançar de corpo e alma e sem rede de proteção na criação de Ossada que, infelizmente, encerrou sua
primeira temporada no domingo 03/02/2019 no SESC Pompeia.
Segundo
ela os textos da inglesa Maureen Lipman lhe chegaram às mãos por meio de uma
amiga também inglesa. Ester escolheu cinco histórias, juntou textos da poetisa
polonesa Wislawa Szymborska e de Laurie Anderson e com a colaboração de Elzemann
Neves e João Wady Cury criou a dramaturgia deste perturbador espetáculo.
Para
a tradução cênica, Laccava contou com a colaboração das iluminadoras Mirella
Brandi e Aline Santini que realmente são cocriadoras como bem atesta a ficha
técnica constante no programa. A luz dialoga com a performance da atriz e com o público, criando ambiente digno de
participar da Bienal de Praga, pois o trabalho dessas magas da iluminação funciona
como uma verdadeira cenografia do espetáculo.
Quanto
à interpretação de Laccava... Poderosíssima e visceral desde sua entrada em cena andando e
depois correndo no meio do público; passando pela tragédia de filhas em relação
aos pais (uma em dúvida se desliga os aparelhos do pai agonizante em um
hospital e outra liquidando o pai que a maltrata), ansiosa ao tentar acender um
cigarro durante uma tormenta (a cena mais bela do espetáculo), dançando ao som
de Stevie Wonder, patética como uma mulher bêbada fazendo speech durante a festa de casamento do filho e, finalmente, neutra
em palestra no Museu de História Natural. Versatilidade e energia não faltam a
essa atriz que se realiza também como criadora deste ousado Ossada.
Ossada não pode se limitar às 16
apresentações realizadas no SESC Pompeia. É espetáculo para se expandir, para
ser assistido e admirado por muita mais gente e assim cumprir seu papel
admirável como um dos trabalhos mais criativos apresentados nos palcos
paulistanos nos últimos anos. Muito moderno sem ser modernoso, nem pretensioso.
Contemporâneo, sem ser inacessível. Belíssimo e comovente, além de fazer
refletir sobre o tempo presente. É ver para crer.
04/02/2019
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