sábado, 14 de maio de 2022

PLAY BECKETT

 

Foto de Arnaldo D'Ávila

Meu primeiro contato com Beckett foi em 1969, com Esperando Godot dirigido por Flávio Rangel e tendo Cacilda Becker naquele que seria seu último papel de uma carreira tragicamente interrompida no intervalo de uma das apresentações da peça.

A partir daí muitos Estragons, Wladimirs, Pozzos, Luckys, Winnies, Krapps, Clovs, Hamms, assim como aquelas personagens das peças curtas, passaram pelos meus olhos de espectador sempre me assombrando e me fazendo lembrar dos absurdos a que o ser humano está sujeito.

Agora foi a vez de Play Beckett numa realização de Simone de Lucia e Mika Lins, tendo a primeira como atriz e a segunda como diretora.

Diga-se em primeiro lugar que o espetáculo de Mika Lins é esteticamente belíssimo: o cenário de Giorgia Massetani reproduzindo o ambiente do universo caótico contido nas obras do dramaturgo irlandês, incluindo os icônicos chapéu coco e par de botas e a iluminação esplendorosa de Caetano Vilela que participa ativamente da ação são dois elementos da encenação que vão entrar para qualquer antologia que trate desses dois importantes componentes de uma representação teatral.

Foto de Arnaldo D'Ávila

No caso de Play, cabe louvar o precioso e preciso trabalho do operador de luz Guilherme Soares que, atento às falas e aos silêncios, deve fazer verdadeiro malabarismo para acender e apagar spots no momento certo. Só vendo!!

A pantomima Ato Sem Palavra II e as peças curtas Play, Catástrofe e Improviso de Ohio já foram encenadas nos palcos paulistanos por importantes diretores como Rubens Rusche, Irmãos Guimarães e até Peter Brook e estão entre aquelas mais representadas nas inúmeras montagens que se valem sempre de três ou quatro desses dramatículos, mas Mika Lins soube inovar criativamente em cada uma delas dando a impressão que as estamos vendo pela primeira vez.

O horror e o absurdo perante a solidão e a incomunicabilidade no mundo moderno, tão presentes na obra de Beckett, aqui comparecem, principalmente, em Ato Sem Palavras II, Improviso de Ohio e Play, sendo que nesta última há também espaço para uma réstea do humor beckettiano. Há até um toque político na presença do diretor tirânico em Catástrofe.

Marcos Suchara confirma seu enorme talento em todas as suas intervenções e Simone de Lucia e Diego Machado são duas ótimas surpresas.

Questão de gosto, mas a cena do espetáculo que para mim, melhor representa tudo o que Beckett quis dizer com sua vasta obra é Ato Sem Palavras II que tem as brilhantes performances de Suchara e Machado. Fosse eu o diretor seria ela que encerraria a montagem.

As peças são apresentadas por uma voz em off transmitida por megafone lindamente instalado no canto superior direito do palco enquanto se ouve a potente trilha sonora original de Edson Secco.

Como se pode notar, trata-se de montagem realizada com os maiores cuidados de produção e o resultado é de importância e beleza ímpares.

Não se assuste com Samuel Beckett! CORRA para assistir a essa que se inscreve como uma das melhores e mais belas leituras do universo desse importante dramaturgo.

Louve-se também o belíssimo e informativo programa impresso que pode se transformar em um pôster com uma ilustração de Cris Vector que deixaria Beckett muito feliz.

PLAY BECKETT está em cartaz no Teatro Aliança Francesa até 26 de junho com sessões às quintas, sexta e sábados às 20h e aos domingos às 18h. 

14/05/2022

 

 

 

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